Quem nunca ouviu a frase: “Estou trabalhando, mas não assinaram minha carteira” ou ainda: “Não posso ter minha carteira assinada para não perder o Bolsa Família”?
Situações como essas são mais comuns do que parecem e podem gerar prejuízos tanto para o trabalhador quanto para o empregador. Além de fraudar direitos, podem resultar em multas, sanções administrativas e até indenizações, dependendo do caso.
Primeiramente, é importante entender o que significa a chamada “carteira assinada”.
Todo trabalhador no Brasil deve possuir a Carteira de Trabalho e Previdência Social (CTPS), obrigação prevista no art. 13 da CLT:
Art. 13 - A Carteira de Trabalho e Previdência Social é obrigatória para o exercício de qualquer emprego, inclusive de natureza rural, ainda que em caráter temporário, e para o exercício por conta própria de atividade profissional remunerada.
Nela, constam as principais anotações da relação de trabalho: admissão, demissão, função, salário, férias, aumentos, recolhimento de FGTS, INSS, descontos, entre outros. Em outras palavras, toda a vida laboral e previdenciária do trabalhador é registrada na CTPS. Sem esse documento devidamente atualizado, o empregado não consegue comprovar tempo de serviço para fins previdenciários, nem experiência profissional.
Hoje, a assinatura física foi substituída pelo registro digital, realizado no CTPS Digital e no e-Social. A obrigação do empregador continua a mesma, devendo lançar todas as informações do contrato de trabalho. Essa modernização ajuda a evitar fraudes, erros de anotação e até a perda do documento físico, o que costuma gerar dores de cabeça no momento da aposentadoria.
A própria CLT, em seu art. 41, reforça:
Art. 41 - Em todas as atividades será obrigatório para o empregador o registro dos respectivos trabalhadores, podendo ser adotados livros, fichas ou sistema eletrônico, conforme instruções a serem expedidas pelo Ministério do Trabalho.
Parágrafo único - Além da qualificação civil ou profissional de cada trabalhador, deverão ser anotados todos os dados relativos à sua admissão no emprego, duração e efetividade do trabalho, a férias, acidentes e demais circunstâncias que interessem à proteção do trabalhador.
Segundo o IBGE , no segundo trimestre de 2025 a informalidade no Brasil atingiu 37,8% da população ocupada , ou seja, 38,7 milhões de pessoas estavam trabalhando sem carteira assinada ou em ocupações informais. Esse número é alarmante, pois milhões de trabalhadores deixam de ter direito à seguridade social. Afinal, quando há vínculo formal, há contribuição obrigatória ao INSS, essencial para custear benefícios previdenciários.
A informalidade, em muitos casos, pode até configurar fraude e crime, especialmente quando o próprio empregado aceita trabalhar de forma clandestina para não perder benefícios sociais como Bolsa Família ou BPC. Trata-se de prática irregular que compromete o sistema e prejudica toda a sociedade.
Mas e quando não há intenção de fraude, e mesmo assim o empregador mantém o vínculo sem registro?
Nesses casos, antes de ingressar na Justiça, recomenda-se que o trabalhador dialogue com o empregador, explicando a irregularidade e os riscos envolvidos. Entre eles, destaca-se a multa de R$ 3.000,00 por empregado não registrado, além da obrigação de recolher FGTS, INSS e tributos de forma retroativa, com juros e multas. É o que dispõe o art. 47 da CLT.
Art. 47. O empregador que mantiver empregado não registrado nos termos do art. 41 desta Consolidação ficará sujeito a multa no valor de R$ 3.000,00 (três mil reais) por empregado não registrado, acrescido de igual valor em cada reincidência.
Se, mesmo após o alerta, o empregador não regularizar a situação, é possível recorrer ao Ministério do Trabalho, que possui meios administrativos mais eficazes para aplicar sanções.
E quando o vínculo chega ao fim sem que nunca tenha havido registro?
Nesse caso, o trabalhador pode ingressar com reclamação trabalhista, a fim de comprovar a relação de emprego, mediante demonstração dos requisitos: pessoalidade, habitualidade, onerosidade e subordinação. Reconhecido o vínculo, a Justiça condenará o empregador a registrar a CTPS e pagar todas as verbas devidas: saldo de salário, férias, FGTS, INSS, verbas rescisórias e demais direitos, tudo de forma retroativa.
Portanto, conhecer seus direitos é fundamental. Nunca aceite trabalhar sem registro por medo de perder benefícios assistenciais. A formalização protege o trabalhador, assegura seus direitos e garante o futuro previdenciário. Se estiver nessa situação, procure sempre a orientação de um advogado especialista em Direito do Trabalho e Previdenciário.